
A tragédia de Brumadinho, que
já ocasionou mais de 80 mortes, despertou manifestações de indignação de
políticos de diversas vertentes ideológicas. A bolsonarista Joice Hasselmann
(PSL-SP) disse em seu perfil no Twitter que “o desdém com a vida do nosso povo
parece não ter fim. Somente o MEDO da punição pode evitar crimes como este”.
Ela fala sobre a possibilidade da instalação de uma Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) sobre o caso, proposta também levantada pelo deputado federal
Rogério Correia (PT-MG).
As mobilizações, entretanto,
costumam ter pouco efeito no caso de tragédias como a ocorrida em Minas Gerais.
O desastre de Mariana, em novembro de 2015, motivou também discursos inflamados
e projetos apresentados por diversos deputados, mas as iniciativas acabaram
engavetadas do Congresso Nacional. Eram propostas como a tipificação como crime
hediondo de falhas como o rompimento de barragens e a obrigatoriedade da
apresentação de um plano de emergência para situações do tipo.
Parte da explicação deste
insucesso vem do fato de que muitos deputados têm ligações com empresas do
setor. A “bancada da mineração” reúne parlamentares de diferentes partidos,
interessados em se vincular a uma atividade que gera 200 mil empregos diretos e
responde por 21% das exportações brasileiras.
O deputado federal Leonardo
Quintão (MDB-MG), que não foi reeleito em 2018 e atualmente é subchefe de
Assuntos Parlamentares da Casa Civil, figura como o principal nome do grupo.
Ele teve grande parte de sua campanha em 2014 financiada por mineradoras – na
época em que as doações de recursos por pessoas jurídicas eram permitidas – e
se tornou célebre por, em 2015, apresentar à Câmara um projeto para o Código de
Mineração que havia sido redigido em um escritório de advocacia que atendia a
Vale e a BHP, outra gigante do ramo.
Mas Quintão não é o único a
dialogar com as empresas do setor. As doações eleitorais de 2014 mostram que
parlamentares de todos os principais partidos foram contemplados com recursos
de mineradoras. Entre eles o atual presidente da Comissão de Minas e Energia da
Câmara, Marcelo Squassoni (PRB-SP), e dois de seus antecessores no comando do
colegiado: Jhonatan de Jesus (PRB-RR) e Rodrigo de Castro (PSDB-MG).
O tucano Castro recebeu R$ 300
mil da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) em 2014. A empresa
– propriedade do grupo Moreira Salles, dono do Itaú – abriu os cofres para
contribuir para a campanha de diversos parlamentares naquele ano. Doações de R$
100 mil foram enviadas a concorrentes como Eduardo da Fonte (PP-PE), Antonio
Imbassahy (PSDB-BA) e Vicentinho (PT-SP).
Mas os repasses a parlamentares
de Minas Gerais foram os mais expressivos. Petistas, tucanos, membros de PSB,
PROS e outros partidos estiveram na lista dos beneficiários da CBMM, que também
contou com a então candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT).
O vice-presidente da Câmara e
atual candidato ao comando da Casa, Fábio Ramalho (MDB-MG), foi outro contemplado:
à época no PV, ele teve uma doação de R$ 100 mil. O próprio Rogério Correia,
que agora sugere uma CPI, foi indiretamente contemplado com R$ 1.005 da CBMM em
2014. A verba que abasteceu sua bem-sucedida campanha para deputado estadual
chegou inicialmente aos cofres da campanha do correligionário Reginaldo Lopes
(PT-MG), candidato a deputado federal.
Na atual composição da Comissão
de Minas e Energia, os cinco deputados de Minas Gerais contaram com recursos de
empresas de mineração na campanha de 2014. São eles: Bilac Pinto (DEM), Renato
Andrade (PP), Gabriel Guimarães (PT), Jaime Martins (PSD) e Luís Tibé (Avante).
Mesmo com a proibição das doações
de recursos por pessoas jurídicas, que valeu nas eleições federais pela
primeira vez em 2018, a influência do setor de energia se fez presente. O
segundo maior doador do país foi Rubens Ometto, proprietário da Cosan. Seus
recursos contemplaram 11 membros atuais da Comissão de Minas e Energia da
Câmara.
Produtividade irregular
A Comissão de Minas e Energia da
Câmara, assim como os outros colegiados, teve sua atividade prejudicada pelo
ano eleitoral de 2018. O grupo fez 52 reuniões em 2017, contra 29 no ano
seguinte.
A pauta do colegiado costuma
ficar a reboque dos grandes temas do momentos. Em 2018, por exemplo, grande
parte das atividades do colegiado foi direcionada à greve dos caminhoneiros,
motivada pelo aumento do preço dos combustíveis. Outro tema que recebeu atenção
dos parlamentares foi a privatização da Eletrobras, idealizada no governo do
ex-presidente Michel Temer (MDB) mas ainda não concretizada.
A força da bancada, aliás, foi
bem sentida pelo governo federal no fim de 2017, quando a Medida Provisória
790, baixada pelo Palácio do Planalto em 25 de julho daquele ano, teve sua
vigência encerrada – “caducou”, na linguagem do Legislativo. A norma tinha como
objetivo modificar regras para a mineração, mas acabou encontrando resistências
por divergências na remuneração a estados produtores de minério, como Minas
Gerais e Pará. Com isso, sua tramitação não foi concluída pelo Congresso
Nacional. A situação não é habitual – a maior parte das medidas provisórias
acaba sendo transformada em lei.
Os novos deputados federais e
senadores tomarão posse na sexta-feira (1º), exatamente uma semana após a
tragédia de Brumadinho. O assunto deverá permear os discursos de parlamentares
de diferentes partidos e estados nos próximos dias. A dúvida que fica é se
dessa vez a indignação se converterá em atos concretos, ou seguirá o rumo
tomado após o desastre de Mariana.
Nenhum comentário :
Postar um comentário