Uma equipe de alunos coordenados pela professora Vanessa do
Nascimento, do Instituto de Química da Universidade Federal Fluminense
(UFF), descobriu compostos que podem virar medicamentos para combate a
infecções resistentes a antibióticos, com destaque para a chamada
tuberculose multidroga resistente (TB-MDR), que mata em torno de 250 mil
pessoas a cada ano no mundo. O estudo comprova a eficiência do material
testado no combate à doença.
Pelo estudo, a professora da UFF recebeu o prêmio PeerJ Award,
durante o 8º Workshop da Rede Científica Internacional Selênio Enxofre e
Catálise Redox (WSeS-8), em junho, na Itália. O trabalho será publicado
na revista inglesa de divulgação científica PeerJ Life & Environment ainda neste ano.
Em entrevista à Agência Brasil, Vanessa explicou que
existem, atualmente, cepas de bactérias que são resistentes a todos os
fármacos liberados hoje para tratamento da tuberculose. “A gente sabe
que bactéria vai sofrendo mutações e vai se tornando resistente.” Os
compostos sintetizados na UFF apresentaram atividade frente a essas
cepas resistentes, isoladas de humanos. “Eles podem virar medicamentos,
não só por apresentarem essas características, mas eles são obtidos de
substâncias baratas. Por exemplo, a gente consegue extrair derivados de
vitamina K de plantas e também utiliza selênio, que é um micronutriente
essencial à vida. A gente une essas duas espécies e obtém esses
compostos”, disse a pesquisadora.
Foi verificado que, mesmo em altas concentrações, os compostos não
matam as células sadias. “Tem todos esses pontos que são positivos para
essas moléculas que a gente desenvolveu.”
Desafio
O próximo passo é despertar o interesse da indústria farmacêutica,
uma vez que essa tuberculose resistente a medicamentos tem sido um
desafio para ser atacada e é a principal causa de morte dos portadores
da doença. As informações recebidas por Vanessa de secretarias de Saúde
relatam grande número de casos positivos no país, e especialmente
positivos para essas bactérias resistentes.
“É, realmente, um SOS, um pedido para que se dê mais atenção, porque a
tuberculose acomete principalmente a população de baixa renda”. Segundo
a professora, um dos sonhos dos pesquisadores é contribuir para essa
população que tanto precisa. “Pensando no futuro, eu vejo aí uma boa
promessa para ser desenvolvida em relação a esses compostos.”
Mal do século
A tuberculose assolou o mundo no século 19 e ficou conhecida como o
“mal do século”. Vista como enfermidade do passado, a doença,
entretanto, provocou em todo o mundo, somente em 2017, 1,6 milhão de
mortes, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). A doença
atinge os pulmões, em geral, mas pode afetar outros órgãos do corpo. Um
dos obstáculos em relação ao tratamento é a resistência das bactérias
aos medicamentos existentes hoje no mercado.
Queimadas etapas
Para que haja a manifestação de interesse da indústria farmacêutica,
Vanessa explicou que têm de ser queimadas etapas. Nesse momento, os
resultados foram excelentes, Ela alertou, porém, que são resultados in vitro,
ou seja, em laboratório. Agora, é preciso que a equipe elabore
documento para comunicar à comunidade científica a descoberta. “A partir
daí, a gente consegue respaldo para estudos mais aprofundados,
principalmente in vivo [em animais]”.
Vanessa acredita que em um estágio mais avançado é possível que os
pesquisadores consigam despertar o interesse da indústria. Ela destacou
que tudo precisa ser feito em etapas, até no sentido de proteger a
invenção, porque é necessário ter, no mínimo, o depósito da patente. Na
terceira etapa, conhecida como fase clínica, os testes serão realizados
em humanos. Todas as fases têm de ser aprovadas pela Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa). Dependendo dos resultados, Vanessa
afirmou que é um caminho que pode ser acelerado, em especial diante dos
surtos de tuberculose que estão acontecendo.
O capital usado para a manutenção do laboratório é oriundo do
Programa de Fomento à Pesquisa da UFF (FOPESQ) e de um auxílio do
Programa de Pós-Graduação em Química aos docentes. De acordo com
Vanessa, os estudos com selênio orientam a equipe na criação de novos
produtos para o tratamento da tuberculose e de outras doenças
negligenciadas.
Tratamento no Brasil
O ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, anunciou no dia 9 de
setembro a simplificação na medicação de combate à tuberculose em
crianças de até 10 anos. Atualmente, o tratamento é feito com três
comprimidos na fase intensiva do combate à doença e dois comprimidos na
fase moderada. A partir de 2020, um comprimido efervescente, aplicado em
cada fase, reunirá os compostos de toda a medicação necessária. A
medida se justifica, segundo o ministro, para facilitar a estocagem e
distribuição do medicamento. Além disso, segundo ele, uma única dose,
com um comprimido efervescente, garante a ingestão correta e a
efetividade do tratamento.
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