Nesta quinta-feira, 14 de janeiro, completam-se quatro anos desde
que o RN e o mundo pararam para assistir a rebelião que culminou no
maior massacre ocorrido dentro de um presídio do Estado. A Penitenciária
Estadual de Alcaçuz, em Nísia Floresta, foi tomada por uma batalha
entre presos de facções criminosas rivais que resultou em 27
assassinatos, cenas de selvageria, dezenas de fugas e destruição de
parte da estrutura daquela unidade prisional.
O Inquérito, que demorou 2 anos e 10 meses para ser concluído, foi
remetido à Promotoria de Nísia Floresta em dezembro de 2019, com 2.610
páginas distribuídas em 14 volumes físicos. O MPRN informou, em nota,
que começou a analisar o processo, “mas com a suspensão da tramitação de
processos e as dificuldades impostas ao funcionamento das instituições,
em razão da pandemia da covid-19, esse trabalho foi dificultado, mas já
foi retomado".
A Polícia Civil pediu a prisão preventiva daqueles que foram
indiciados e que, inclusive, já cumpriam penas, mas o órgão ministerial
entendeu que, quase três anos depois, não seria mais possível. “(...) o
MPRN ofertou parecer pelo indeferimento da prisão preventiva dos
indiciados por não haver contemporaneidade com os fatos, requisito
exigido pelo código de processo penal - ou seja, como os crimes
aconteceram em 2017, não se poderia decretar a prisão em 2019", diz a
nota. O MPRN alegou que a Promotoria atuou neste período de forma
extrajudicial, realizando fiscalizações na penitenciária para verificar
medidas adotadas que resguardassem a dignidade dos presos.
A TRIBUNA DO NORTE também realizou uma visita à Penitenciária.
Nesta quarta-feira (13), véspera do dia que marca os quatro anos da
chacina, a TN foi verificar como está o presídio que foi palco de um
massacre entre presos, transmitido ao vivo para todo o mundo pelas
equipes de reportagem que se aglomeravam diuturnamente nas dunas ao
redor, de onde se tem uma visão privilegiada dos prédios que compõem o
complexo. A topografia da área propiciou isso. Das dunas, a visão do
complexo é nítida, porém, a calmaria agora toma o lugar daquelas cenas
de violência que resultaram em corpos empilhados no chão do pátio do
Pavilhão 4, jogados em fossas, espetados em lanças, esquartejados,
carbonizados ou enterrados.
Cicatrizes da barbárie
As marcas da barbárie ainda aparecem no antigo refeitório, onde os
criminosos subiram, hastearam bandeiras das facções criminosas e
picharam insultos aos rivais e frases de domínio. A estrutura não é mais
utilizada e será demolida para construção de um novo equipamento. O
mesmo deve acontecer com o prédio da antiga fábrica de bolas, onde os
detentos queimaram cadáveres de seus inimigos. Marcas de fumaça ainda
são vistas no teto. “Aquele lugar ainda gera uma energia pesada quando a
gente entra", comentou um dos policiais penais durante a visita.
O episódio demonstrou o completo descontrole do Estado com as
prisões. Demorou 15 dias para o Governo reassumir o total controle da
unidade.
Ivo Freire, que era o diretor da unidade à época, lembra que a
capacidade naquele ano era de 520 internos, mas havia cerca de 1.200. O
ex-diretor, hoje chefe do GSI do Governo, disse que considera aquele
como o momento de falência do Sistema, mas que dificilmente voltaria a
acontecer. “Podemos considerar que ali foi a falência do Sistema
Prisional do RN. Mas hoje temos pessoal mais treinado, procedimento
operacional padrão para que a gente consiga atuar. Então, pra mim,
atualmente é impossível acontecer o mesmo que em 2017", declarou.
O difícil recomeço após a chacina
Imediatamente após aquele fatídico episódio, foram tomadas medidas
ligadas à estrutura da penitenciária. Uma reforma e a reconstrução do
pavilhão 4 com 422 vagas foram apresentadas como forma de reduzir a
superlotação e garantir mais segurança. A lotação ainda persiste. O
número de vagas, segundo dados da SEAP, é 620, mas há 1.600 apenados.
Contudo, agora os detentos não ficam mais soltos nos pavilhões. As celas
têm grades e todas as tomadas foram retiradas. A fiação elétrica e a
iluminação é feita a partir dos corredores. A organização e a limpeza
dos ambientes da prisão contrastam com as imagens divulgadas durante a
rebelião.
O monitoramento eletrônico é outro avanço. Foi ampliado e ligado ao
Ciospe todas as revistas são realizadas por meio de um bodyscan. Os
bloqueadores de sinal de telefones celulares não existem mais. De acordo
com a SEAP, esses equipamentos não são necessários porque não é mais
possível o acesso de aparelhos celulares nas unidades prisionais. Além
disso, os bloqueadores sofrem rápida defasagem devido ao avanço da
tecnologia dos celulares e precisam ser atualizados gerando um custo
alto.
“Alcaçuz hoje é uma unidade controlada, de extrema segurança, onde
não houve mais fugas nesses quatro anos e teve uma evolução
significativa na disciplina do interno e nas ações sociais e de
capacitação dos servidores. Os detentos passam por controle diário de
identificação e triagem do tipo penal", explicou Flávio Lúcio, atual
diretor.
A partir dessa triagem, somado à interrupção da entrada de
materiais proibidos e do controle das celas, é possível manter o domínio
da situação como se espera se um sistema prisional. As medidas também
levaram à ampliação do trabalho de ressocialização.
O interno Flávio Gomes, 37, é um dos incluídos num dos projetos.
Ele chegou à Alcaçuz em 2018 e não presenciou o massacre. Segundo disse,
conversa com alguns que estavam lá durante a rebelião e a sensação
agora é de mais segurança. “Hoje, eu vejo a cadeia tranquila. Depois de
fechar as celas me sinto mais seguro. Era tudo aberto, a gente ficava
vulnerável e qualquer 'treta', a pessoa ia pra faca. Agora, se o cara
der um grito na cela, o agente chega e tudo se resolve", contou.
Fonte TRIBUNA DO NORTE
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