segunda-feira, 13 de abril de 2020

A história verdadeira por trás do “meme do caixão” ocorre em Gana, na África


Quando o cliente vem até nós, perguntamos: ‘Você quer algo solene ou um pouco mais de teatro? Ou talvez uma coreografia? É só pedir que nós fazemos”, diz Benjamin Aidoo
Só o humor salva — quando salva. Os dramaturgos gregos sabiam combinar tragédia e comédia com rara habilidade. Mestria que o britânico William Shakespeare assimilou à perfeição. Rir da comédia é fácil, às vezes as piadas são “tão prontas” que o riso, para sair, tem de ser quase à força. Mas é possível rir do trágico? É provável e talvez revele não insanidade, e sim saúde mental.
A maioria dos homens não quer morrer e luta, com unhas, dentes e medicamentos — até a mágica cloroquina, no Brasil já conhecida como “cloroquinara” (numa referência ao presidente Jair Bolsonaro) —, para continuar sobre a Terra. A grande batalha humana é para não entrar num caixão — nem por brincadeira. Nos velórios, nas margens dos caixões, as pessoas quedam-se com faces compungidas, olham o defunto e quiçá imaginam sem expressar em palavras: “Ufa! Ainda bem que não sou eu”. Um pouco mais longe do caixão, cujo formato acompanha as formas do corpo humano, as pessoas conversam “normalmente” e, às vezes, contam alguns “feitos” do único que, a rigor, não pode ouvir, pois está mortinho da silva. O velório e o enterro, irmãos siameses, parecem uma coisa triste, e é. Mas pode ser mais alegre, celebrando mais a vida, que é o principal, e sugerindo que a morte é apenas uma parte, ínfima, da história do indivíduo, e que, longe de ser um fim, pode ser um recomeço? A pessoa morre, mas sua história fica, e será contada e contada, não raro de maneira mitológica.
Neste momento de pandemia do coronavírus, bichinho letal que já matou ou contribuiu para matar mais de 100 mil pessoas no mundo, as pessoas acham tempo para se divertir, para tentar escapar das dores. O “meme do caixão” diverte, mas há quem acredite que se trata de fake news, sobretudo por causa de uma montagem criativa. O centro do meme é a dança do caixão, mas imagens correlatas, como a de um bicho que abre um veículo para “comer” uma pessoa e a de um homem que lança um míssil — mas ele não atinge os inimigos mas seus aliados, que estão próximos —, funcionam como complemento. Divertido? Demais. Mesmo o mais sério dos homens, mesmo que aquele que está pensando em se esconder debaixo da cama para escapar do coronavírus — um homem do povo disse ao produtor rural Rodrigo Zani que, para combater os chineses, os presidentes Jair Bolsonaro, do Brasil, e Donald Trump, dos Estados Unidos, vão nos levar para morar no subsolo —, ri ou vai rir do “meme do caixão”.

Benjamin Aidoo: o artista que criou o funeral divertido, dançante e teatral | Foto: Reprodução
A República do Gana (gana significa “guerreiro rei”), que fica na África Ocidental, tem 28,3 milhões de habitantes. Entre eles se destaca Benjamin Aidoo, um carregador de caixões profissional. Ele é o criador da dança do caixão, que, sim, é um fato.

Entrevistado pela BBC, Benjamin Aidoo disse que seu projeto era levar mais alegria e ginga aos funerais. “Quando o cliente vem até nós, perguntamos: ‘Você quer algo solene ou um pouco mais de teatro? Ou talvez uma coreografia? É só pedir que nós fazemos.”
No vídeo, agora transformado em meme, homens aparecem carregando um caixão e dançam de maneira harmoniosa — numa espécie de balé que celebra não a morte, mas a vida.  Adiciona-se à perfeição a música “Astronomia 2K19”, do produtor italiano Stephan F., e o espectador mal percebe a troca de cenários. Ou até percebe, mas fica com a impressão de que tudo é uma continuidade da “dança do caixão”.
Fizeram arte com a arte de Benjamin Aidoo. Resta aceitar que só o humor salva… se salva.


Jornal Opção

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