domingo, 6 de outubro de 2019

Em pequenas cidades do Estado, legislação é genérica e frágil

O Plano Diretor nas menores cidades do Brasil são desconexos com as necessidades desses locais, avalia um estudo de 2015 da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) intitulado “Planos Diretores para Municípios de pequeno porte” - são classificados como “pequeno porte” as cidades com até 25 mil habitantes. Para George Câmara, ex-presidente do Conselho Nacional das Cidades e mestre em estudos urbanos regionais, no Rio Grande do Norte isso não é diferente.
Segundo ele, é comum que em alguns municípios sejam contratadas consultorias que acabam “importando” planos diretores de outros locais de forma genérica. “O efeito disso é que se deixa de observar a especificidade de cada cidade, não olha as necessidades locais”, afirma Câmara. “Acontece um pacote genérico, que podem ser inadequadas para as características de uma região”, disse George.

A Região Metropolitana de Natal ainda não possui um plano urbano integrado, que estabeleça diretrizes, projetos e ações para o desenvolvimento urbano e regional do grupo de cidades
O estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) considera que existe uma fragilidade histórica nacional de cidades de pequeno porte para “elaboração de políticas urbanas e estudos técnicos que identifiquem necessidades particulares”. As políticas urbanas eficazes acabam ficando restritas, segundo o estudo, nas maiores cidades, por terem mais capacidade financeira e técnica.
Segundo o pesquisador João Victor Moura, que participa da elaboração do município de Ielmo Marinho, na Grande Natal, até projetos de lei enviados às câmaras municipais são genéricos. “Em alguns projetos de lei, tem 'segundo consta no plano diretor municipal', quando o município ainda não tem Plano Diretor”, afirma Moura.

As consequências para essas cidades é o risco de desenvolvimento desordenado ou inadequado, defende George Câmara. Um exemplo citado é as zonas destinadas à habitação. “Você pode estabelecer uma área da cidade para ocupação, mas não ser uma área que interessa à população. O resultado é que fica abandonada”, declara.
Para a CMN, o Governo Federal é omisso em solucionar esses casos, sem demandar investimentos, capacitação, ações de fortalecimento institucional e assistência técnica. “Inexistem ações específicas na área de planejamento e ordenamento urbano que incentivem os pequenos Municípios a elaborarem os Planos Diretores, revisarem as legislações urbanas em articulação a sua problemática urbana, que difere dos Municípios de grande porte”.
O documento da CNM é um manual para os municípios de pequeno porte aprimorarem as políticas urbanas, principalmente o Plano Diretor. Apesar das diretrizes apresentadas, é defendido que “o governo federal e os Estados assumam suas responsabilidades na instituição de ações contínuas de financiamento e fortalecimento das capacidades institucionais, financeiras e técnicas para instrumentalizar o Entre municipal no atendimento às obrigatoriedades de elaboração e revisão do Plano Diretor”.
Consórcios


Uma saída defendida por George Câmara relacionada às políticas urbanas de cidades menores é a criação de consórcios entre os entes. Para George, isso facilita tanto a elaboração dos planos diretores, quanto o desenvolvimento regional. “A realidade de municípios vizinhos tem semelhanças, então consórcio te ajuda a pensar em conjunto”, diz. “O outro lado positivo é que isso vai desenvolver a região em que esses municípios estão localizados”.
Quatro anos após o Estatuto da Metrópole criar o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI), a Região Metropolitana de Natal ainda não iniciou o processo para elaborar o seu. O documento funciona semelhante aos planos diretores municipais, com a função de estabelecer diretrizes, projetos e ações para o desenvolvimento urbano e regional de um grupo de cidades que convergem entre si. O Fórum Nacional de Entidades Metropolitanas define que o objetivo do PDUI é “reduzir as desigualdades e melhorar as condições de vida da população metropolitana”. “Nesses territórios, instituir o macrozoneamento possibilita a organização das diversas áreas de interesse comum à região, e que perpassam vários municípios”, acrescenta o Fórum.
Avenida Tomaz Landim, que divide Natal e São Gonçalo do Amarante, exige plano urbano integrado
Avenida Tomaz Landim, que divide Natal e São Gonçalo do Amarante, exige plano urbano integrado


Institucionalmente, a Região Metropolitana de Natal tem 15 cidades. Entretanto, o ex-vereador de Natal e mestre em estudos urbanos e regionais, George Câmara, argumenta que apenas seis dessas cidades estão de fato integradas. “É o que eu chamo de Região Metropolitana funcional. Essas seis cidades dialogam entre si, exercem influência mútua”, afirma.
George Câmara atua há 18 anos com discussões sobre as regiões metropolitanas e presidiu o Conselho Nacional das Cidades entre os meses de outubro de 2014 e 2016. Apesar da crítica à quantidade de municípios na Grande Natal, ele afirma que elaborar o PDUI é importante para as seis que estão na zona “funcional”. Um efeito prático seria elaborar uma legislação em comum para as áreas urbanas que separam uma cidade da outra.
O PDUI pode dar diretrizes relacionadas ao transporte metropolitano, planos de macrodenagem, destinação de resíduos sólidos e legislações ambientais. Todas as diretrizes também são tratadas em planos diretores municipais, mas a especificidade do PDUI são zonas que afetam mais de uma cidade.
Um exemplo dado por Câmara é a avenida Tomaz Landim, que divide Natal de São Gonçalo do Amarante. “Se Natal for elaborar um Plano de Drenagem para essa área, tem que considerar o bairro do Jardim Lola, que fica do lado de São Gonçalo do Amarante. O PDUI estabelece essas diretrizes, cria mecanismos de abertura para o debate”, considera George.
Quando o Estatuto das Metrópoles foi criado, em 2015, durante o governo Dilma Rousseff, a legislação estabeleceu que os Estados deveriam criar os PDUI das regiões metropolitanas no prazo máximo de dois anos. Em 2017, durante o governo Michel Temer, esse prazo foi prorrogado para 2021. O adiamento aconteceu com o apoio dos Estados e Municípios porque apenas 70 das 20 regiões metropolitanas mais importantes do Brasil avançaram na elaboração do documento.
Esse processo sequer foi iniciado no Rio Grande do Norte. George Câmara, que hoje é secretário-adjunto de Finanças e Planejamento (Seplan), afirma que a atual gestão prevê a criação do PDUI da Grande Natal nos próximos quatro anos e que as discussões devem iniciar com a posse dos conselheiros no Conselho Metropolitano, previsto para o dia 17. “O PDUI certamente vai entrar em pauta no Conselho”, defende Câmara.

Estatuto das Metrópoles
A criação do Estatuto da Metrópole e de um plano para as zonas metropolitanas foi pensado com o entendimento de que os planos diretores municipais eram insuficientes para algumas áreas, que sofrem influência mútua de mais de uma cidade. É o caso do bairro de Nova Parnamirim, que dissolveu as fronteiras entre Natal e Parnamirim, por exemplo.
De acordo com George Câmara, antes dessa legislação, um plano de gestão para levar em consideração zonas de outras cidades “dependia da boa vontade dos prefeitos”. No histórico de legislações das cidades, o primeiro passo dado para incentivar a política das cidades como blocos foi em 2005, com a lei de Consórcios Públicos.

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