Órgão recorreu ao Ministério Público para liberar recursos
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda) recorreu ao Ministério Público Federal (MPF) para tentar
desbloquear cerca de R$ 56,7 milhões do Fundo Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente (FNCA) que, segundo o presidente do colegiado,
Marco Antônio Soares, estão indisponíveis.
Responsável por promover, defender e garantir os direitos de meninos e
meninas com menos de 18 anos, o Conanda oficiou a procuradora federal
dos Direitos do Cidadão, Debora Duprat, no último dia 3. No documento
assinado por Soares, o conselho consulta a procuradora sobre a
legalidade do bloqueio de recursos oriundos de doações e que, portanto,
não dependem do aporte financeiro do Tesouro Nacional.
As receitas do fundo nacional são provenientes de doações de pessoas
físicas e jurídicas, integralmente abatidas do imposto de renda dos
doadores. Também podem vir de contribuições feitas por governos ou
organismos estrangeiros e de recursos destinados pela própria União. Ao
montante total também são acrescidos os resultados de aplicações
financeiras, bem como valores destinados por outras fontes. Em maio, a Receita Federal
divulgou que, neste ano, 62.688 contribuintes destinaram cerca de R$
67,88 milhões para o fundo. É o maior valor já registrado desde 2013,
quando o repasse começou a ser feito
Os recursos destinados ao fundo devem ser integralmente destinados à
execução de políticas, ações e programas em benefício de crianças e
adolescentes. Ou seja, servem, segundo o Conanda, “de complemento aos
recursos orçamentários que, na forma da lei devem ser canalizados para o
atendimento da população infanto-juvenil com a mais absoluta
prioridade”.
À Agência Brasil, o presidente do Conanda disse
acreditar que, atualizado, o valor indisponível pode chegar a R$ 60
milhões. Segundo ele, o valor seria o suficiente para o fundo financiar a
construção, por governos estaduais, de pelo menos 20 unidades
socioeducativas. De acordo com Soares, o projeto básico que o Conanda
disponibiliza aos governos estaduais prevê um custo entre R$ 2 e R$ 3
milhões por unidade.
“Óbvio que esses recursos indisponíveis não seriam destinados a uma
só ação. Eles serviriam para custear políticas de combate ao abuso e à
exploração sexual de crianças e adolescentes; para a capacitação de
conselheiros; a institucionalização do Sistema de Garantia de Direitos;
fortalecimento do Sinase [Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo] e outras ações”, disse Soares. “Em um contexto de
recursos escassos, em que temos que optar entre quais projetos
desenvolver e quais deixar de lado, essa limitação restringe ainda mais a
nossa capacidade de efetivar políticas públicas setoriais”,
acrescentou.
Em uma nota técnica anexada ao pedido para que o MPF se pronuncie se
considera legal a indisponibilidade dos recursos destinados ao fundo, o
conselho detalha que o limite orçamentário para a execução do fundo caiu
de R$ 16,86 milhões, em 2017, para R$ 13,32 milhões em 2018.
Procurado pela reportagem, o MPF informou que o ofício encaminhado
pelo Conanda está sendo analisado pelos integrantes do Grupo de Trabalho
Direitos da Criança e do Adolescente, da Procuradoria Federal dos
Direitos do Cidadão (PFDC).
Em nota, o Ministério do Planejamento reconheceu que o fundo nacional
já contabiliza R$ 56,7 milhões em “superávit financeiro”, ou seja, são
uma "sobra de caixa", recursos financeiros que ainda não se encontram
comprometidos com pagamentos futuros e que, segundo a Lei 4.320/64,
podem ser utilizados como fonte de financiamento para a abertura de
créditos orçamentários adicionais no exercício seguinte. O Planejamento
garantiu não haver nenhuma inconstitucionalidade na execução
orçamentária do FNCA, ainda que o presidente do Conanda afirme que,
legalmente, compete a ele deliberar sobre os recursos provenientes das
doações.
“Apesar do superávit financeiro estar previsto na Lei 4.320/64 como
fonte de recursos para abertura de crédito adicional, com o advento da
Emenda Constitucional Nº 95 [conhecida como emenda do teto dos gastos
públicos, por limitá-los pelos próximos 20 anos, vinculando o aumento de
despesas orçamentárias à inflação média do ano anterior], para essas
solicitações, os órgãos têm que oferecer cancelamento em programações no
valor igual aos das suplementações solicitadas”, explicou, em nota, o
Planejamento.
A pasta ainda acrescentou que, dos R$ 20,82 milhões destinados ao
fundo pelo Orçamento deste ano, R$ 13,3 milhões são para despesas
discricionárias (aquelas que o governo pode ou não executar, conforme a
previsão de receitas) e R$ 7,5 milhões para as despesas financeiras.
Deste total, apenas R$ 500 mil estariam contingenciados. “Ressalte-se
que os limites estabelecidos pelo Decreto nº 9276, definidos de forma
global pelo Ministério do Planejamento, afetam as programações
discricionárias do ministério [dos Direitos Humanos] como um todo,
cabendo ao órgão a gestão e priorização dos recursos necessários ao
pleno cumprimento das atribuições das unidades orçamentárias e dos
serviços entregues à população”. O Ministério dos Direitos Humanos
reiterou a posição do Ministério do Planejamento.
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