sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Natal - Madrugada na calçada para tirar RG

Fonte: Tribuna do Norte
Yuno Silva
Repórter

Mãe de dois meninos em idade escolar, Maria Magna de Oliveira, de 32 anos, doméstica, moradora do Vale Dourado, bairro da zona Norte de Natal, precisa providenciar a carteira de identidade de ambos para efetuar a matrícula dos filhos na rede pública de ensino. Ela, o marido e os meninos são os primeiros da fila da Central do Cidadão da Zona Norte. São 5h45 de quinta (12), essa é a quarta tentativa de buscar atendimento, que só está garantido por que a família resolveu acampar na porta do prédio onde funciona a Central, na Av. Dr. João Medeiros Filho número 2.300, às 17h do dia anterior.
Magnus Nascimento
Às 6h50 de ontem (12), mais de 500 pessoas se aglomeravam na calçada em frente à Central do Alecrim, disputando uma das 190 senhas que seriam distribuídas às 7h

Das 40 fichas disponíveis para emissão de RG (1ª, 2ª e 3ª vias), Magna receberá duas, que serão distribuídas às 7h – ela só será atendida a partir das 8h. Ela não trouxe colchão, mas os mais precavidos trouxeram colchão, lençol, travesseiro e cadeira de praia. Todos dormiram ao relento, sentados no batente do canteiro sem plantas ou no chão, e se chover não tem escapatória. Com o raiar do dia, ambulantes oferecem bolo e café preto para o desjejum dos acampados.
“É um absurdo essa situação, um absurdo, uma humilhação. Desde às 23h de ontem já tinha mais de 40 pessoas na fila”, resumiu dona Maria Cícera Dantas de Oliveira, pescadora de 56 anos, a segunda da fila. Cícera veio acompanhar o marido, o pescador aposentado Paulo Cândido da Silva, 60, que precisa de uma segunda via da carteira de identidade para continuar recebendo o benefício pois uma doença roubou-lhe os movimentos das mãos. “Vim a primeira vez ontem (quarta, dia 11) às 5h, mas a fila já estava enrolando na outra rua. Voltei de tarde para conseguir ser atendida”, contou a pescadora.
Magnus Nascimento
Maria Magna (de preto) tentava senha pela quarta vez na Z. Norte

Dona Cícera afirma que é comum a presença de pessoas vendendo o lugar na fila por R$ 30 na Central do Cidadão Zona Norte. Apesar da reportagem ter tentado, em vão, uma declaração anônima do 'comerciante' para saber como funciona o negócio, outras pessoas da fila confirmaram o comércio da ficha para atendimento no guichê do Instituto Técnico-Científico de Perícia (Itep-RN).
Na Central Zona Norte não há atendimento preferencial: idosos, mulheres grávidas, crianças de colo e deficientes físicos disputam as vagas com jovens e adultos. A dificuldade se restringe ao serviço prestado pelo Itep-RN, sobrecarregado pelo quadro deficitário de servidores, o atendimento é mais tranquilo para os demais serviços, como emissão de CPF e Carteira de Trabalho por exemplo.
Grande parte da demanda, pelo menos neste início de ano, é para emitir RGs de novos alunos, uma exigência das escolas para efetivar matrículas. A estudante Alessandra Torres, 12 anos, de São Gonçalo do Amarante, estava na posição 42, mas estava esperançosa. “Estou arriscando. Cheguei às 2h30 da madrugada, estou a três dias sem dormir direito e só tenho até amanhã pra fazer minha matrícula”, lamentou.
Já Jonh Lennon da Silva, de 26 anos, morador de Igapó, cumpriu 9 meses no regime fechado e há 4 meses cumpre a condicional. Todas as semanas ele precisa assinar presença, perdeu os documentos, e se não tirar uma nova via corre risco de voltar pra cadeia. “O jeito é vir dormir aqui também”, resignou-se.
Estruturas
Central do Cidadão Via Direta
O atendimento do Itep-RN conta com dois funcionários para atendimento, e o número médio de identidades emitidas é de 120 por dia.

Central do Cidadão Alecrim
A unidade também agrega a sede da Central de Identificação do Itep-RN. Treze funcionários prestam atendimento e cerca de 300 RGs são emitidos diariamente.

Central Zona Norte
Apenas u funcionário do Itep-RN presta atendimento (o outro está de férias). Cerca de 40 carteiras são emitidas por dia.

As Centrais começaram a operar em Natal em 1997 com duas unidades, mas já funcionaram cinco unidades na capital potiguar - além das três atuais, também funcionavam Centrais na Av. Rio Branco, na Cidade Alta; e no Praia Shopping em Ponta Negra. Atualmente, são 21 Centrais espalhadas pelo Estado, que oferecem serviços diversos como atendimento de órgãos como a Delegacia Regional do Trabalho, Sine, concessionárias de água, luz e telefonia, Detran, Itep-RN, Polícia Federal e TRE.

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