O Ministério da Fazenda descartou socorrer o Rio
Grande do Norte por meio de repasse de recursos do Orçamento, que seriam
usados para o pagamento de salários dos servidores. A pasta enviou uma
carta ao governador do Estado, Robinson Faria (PSD), comunicando a
decisão. A negativa abriu uma crise com o governo estadual, que tinha
conseguido o patrocínio do Palácio do Planalto para a operação e
esperava ver o dinheiro até o fim deste ano.
Na
véspera do Natal, o governador chegou a prometer no Twitter que os
salários atrasados dos servidores seriam pagos nos próximos dias, a
partir da edição de uma medida provisória que estava sendo negociada
pelo Mistério do Planejamento para transferir R$ 600 milhões do governo
federal.
"Vamos pagar o décimo-terceiro até o dia 10 de
janeiro e vamos pagar o mês de dezembro até até o dia 30 de janeiro",
publicou Robinson Faria.
Mesmo com o aval do Planalto, a operação enfrentava
resistência da área econômica, que vê na concessão de um socorro desse
tipo um precedente de alto risco no relacionamento com os Estados.
Na carta encaminhada ao governador, o
secretário executivo da Fazenda, Eduardo Guardia, argumentou que parecer
do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU)
inviabilizava a operação.
O procurador Júlio Marcelo de Oliveira
recomendou na última sexta-feira (22), que a equipe econômica impedisse a
realização da operação diante do risco de descumprimento da
Constituição e da Lei de Responsabilidade Fiscal ao destinar o dinheiro
para pagamento de pessoal.
O próprio governador deixou claro que os
salários dos servidores seriam pagos com a ajuda federal. “A
recomendação serve para esclarecer qualquer possível dúvida que alguém
ainda pudesse ter (sobre a legalidade da transferência) e servir de
alerta, sim. Isso é crime de responsabilidade”, disse Oliveira ao
Estadão/Broadcast.
Na carta, Guardia diz que o parecer do MP-TCU
é “conclusivo” e que a operação de “natureza voluntária” afrontaria o
princípio da equidade na transferência dos recursos federais entre os
Estados.
O secretário chegou a dizer que essa mesma
avaliação já tinha sido feita por diversos ministros do TCU durante o
julgamento da consulta feita pelo Ministério do Planejamento à corte de
contas em relação a essa questão. Mesmo assim, no entanto, o plenário do
TCU deu aval à operação.
Guardia disse ainda que o governo estuda
outras alternativas e que a Fazenda está à disposição para discutir
soluções para o problema fiscal do Rio Grande do Norte. Segundo apurou o
Estadão/Broadcast, a decisão repercutiu negativamente no Estado, que
promete retaliar.
O secretário de Tributação do Rio Grande do
Norte, André Horta, disse não ter recebido a carta e preferiu não
comentar a decisão. A reportagem não conseguiu contato com o governador
até o fechamento desta edição. O Ministério da Fazenda disse que não
iria comentar.
Sangria
Na recomendação, o MP-TCU alerta que o repasse da
União para o Estado do Rio Grande do Norte pagar despesas remuneratórias
de servidores das áreas de saúde, educação e segurança pública
configuraria precedente jurídico para que os demais Estados e mais de
5,5 mil municípios reivindicassem o mesmo tratamento no campo político e
ou judicial.
"Se esse dinheiro for liberado para pessoal, é
o início de uma sangria de bilhões de reais na União. Adeus ajuste
fiscal", disse o procurador.
O governo federal repassou R$ 2,9 bilhões ao
Rio de Janeiro no ano passado, mas a operação tinha características
distintas, uma vez que o dinheiro era destinado a garantir a segurança
em um evento internacional, no caso os Jogos Olímpicos.
A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula
Vescovi, afirmou em entrevista ao Estadão/Broadcast na última
terça-feira, 19, que o órgão foi surpreendido pela gravidade exposta
pelo Rio Grande do Norte, uma vez que o próprio Estado vinha negociando
novas operações de crédito com aval da União. O Estado não tem dívida
com a União, mas mesmo assim não conseguiu nos últimos anos regularizar
sua situação financeira.
A secretária falou ao Estadão/Broadcast antes
da manifestação do MP-TCU e também do envio da carta pelo Ministério da
Fazenda. Ela explicou que o Tesouro estruturou um relacionamento com os
Estados baseado em contrapartidas para um ajuste estrutural, mesmo que
gradual.
"Nós não vemos condições de escapar dessa
lógica de relacionamento. É impossível inferir qual Estado fez um ajuste
adequado e qual está com menos problema. Tem um risco moral embutido
muito alto", afirmou a secretária.
O Tesouro enviou uma missão técnica ao Rio
Grande do Norte para avaliar a situação financeira do Estado. Além
disso, o Banco Mundial negocia com o Estado um programa similar ao RRF,
pelo quando o organismo concederia um crédito novo para que o governo
estadual possa reequilibrar suas contas, em troca de medidas de ajuste
fiscal.
"Não há espaço para transferências
unilaterais dentro do arranjo federativo que estamos construindo. A
isonomia de tratamento é um valor essencial perseguido pelo Tesouro",
disse Ana Paula na entrevista.
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