Com a transferência de
integrantes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) para
presídios federais, o governo espera isolar esses líderes. A intenção é
dificultar o contato deles com o grupo e evitar que consigam dar ordens de
dentro dos presídios.
O líder da facção, Marcos
Willians Herbas Camacho, o Marcola, e outras 21 pessoas foram transferidos para
presídios federais em Brasília, Rondônia e Rio Grande do Norte. Eles cumpriam
pena em presídios estaduais em Presidente Venceslau e Presidente Bernardes, no
interior de São Paulo. Por segurança, o governo disse que não divulgará para
onde foram levados cada um dos 22 presos.
Em nota, o Ministério da Justiça
disse que "o isolamento de lideranças é estratégia necessária para o
enfrentamento e o desmantelamento de organizações criminosas".
Especialistas ouvidos pela BBC
News Brasil apontam, contudo, que é muito difícil garantir, mesmo em presídios
federais, que os líderes não passem recados e tampouco recebam informações.
Eles lembram que as facções são muito organizadas e estão sempre prontas para
substituir seus líderes. Outro alerta feito por especialistas é a possibilidade
de medidas como essa aumentarem a criminalidade nas cidades que recebem esses
presos.
No mesmo dia da transferência,
foi publicada uma portaria assinada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, com
regras para visitas em penitenciárias federais. O texto determina que as
visitas sejam exclusivamente por parlatório -- ou seja, separado por um vidro e
com comunicação pelo interfone -- ou videoconferência.
A visita social será para
cônjuges, companheiros, parentes e amigos, segundo o texto. O encontro em pátio
de visitação só será permitida, uma vez por mês, para o preso que passar 360
dias seguidos com ótimo comportamento carcerário.
Recado por meio das visitas
Consultor do Senado na área de
Segurança Pública, João Paulo Botelho diz que é possível que um presídio
federal tenha uma segurança maior que um estadual, mas aponta que é muito
difícil bloquear o contato do preso com o exterior do presídio.
"A transferência é para
tentar tornar o cara incomunicável, mas sempre tem um agente que pode ser
corrompido, um advogado ou familiar que vai transmitir recado pra fora, a
revista pode não ser 100%, o pessoal tenta entrar com celular. Será que isso
vai conseguir frear as ordens que esses comandantes vão mandar para
fora?", questionou.
Para Botelho, o cenário mais
provável é que esses líderes continuem dando ordens de dentro dos presídios. O
parlatório, segundo ele, é importante para evitar a passagem de material da
visita para o preso, mas as informações são transmitidas.
"A conversa não pode ser
gravada ou filmada, então o conteúdo continua protegido. Ele pode ali continuar
mandando e recebendo recado", disse.
Rafael Alcadipani, professor da
FGV e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, também acredita que a
chance de dificultar a comunicação dos presos com suas facções é maior em
presídio federal. "Mas vai conseguir um isolamento total e completo?
Existe chance maior, mas não é certo", afirmou.
O grande problema, segundo
especialistas, é que mesmo em um cenário em que fosse possível isolar um líder,
as facções estão organizadas para prontamente substituí-lo.
"Sempre vai surgir outra
liderança, o crime continua ativo. É uma empresa. Quando sai um chefe, entra o
outro", afirmou Alcadipani. "O que a gente precisa é sufocar as
facções financeiramente, repensar como a gente lida com a questão da droga no
Brasil, combater a corrupção em todas as esferas."
Para Botelho, é necessário
"cortar o fluxo de traficantes, evitando a formação do criminoso".
"A solução é afastar do crime durante a infância, na categoria de
base."
Alerta nas cidades que recebem os criminosos
A experiência com a transferência
de presos de facções como o PCC torna necessária uma preocupação com as cidades
que recebem esses indivíduos, segundo a professora da Universidade Brasília (UnB)
Haydée Caruso, que atua no Departamento de Sociologia e no Núcleo de Estudos
sobre Violência e Segurança da universidade.
O motivo, segundo ela, é que a
chegada de um líder de uma facção como o PCC muda a dinâmica local tanto dentro
do presídio quanto fora dele e possibilita o aumento da violência e da
criminalidade.
"O resultado dessas
transferências tem sido a ampliação dos conflitos dentro e fora dos presídios.
Isso porque o PCC não chega em contexto de terra arrasada, mas em contexto em
que há outros grupos de facções disputando hegemonia dentro e fora da
prisão", explicou. "A experiência mostra que nunca é uma transferência
que você consegue neutralizar por completo."
Por isso, segundo ela, as
autoridades precisam pensar em estratégias para minimizar os impactos da
transferências desses líderes de facções para a população local.
Reforço do Exército
Outra medida publicada nesta
quarta-feira foi o decreto que permite o emprego das Forças Armadas até 27 de
fevereiro no entorno das penitenciárias federais em Mossoró (RN) e em Porto
Velho (RO).
A ideia, segundo o ministro da
Defesa, general Fernando Azevedo e Silva, é que a atuação dos militares
aconteça só se houver alguma eventualidade. "O GLO é preventivo. Primeiro,
tem as forças locais de segurança", disse.
Para Rafael Alcadipani, o reforço
do Exército é interessante neste momento. "Nessa situação, todo apoio no
enfrentamento contra crime organizado é bem vindo", afirmou.
Botelho lembra, contudo, que a
segurança do entorno de presídio não é atribuição das Forças Armadas. "O
patrulhamento e vigilância dessas áreas são atribuição da Polícia Militar. A
título de curiosidade, as Forças Armadas têm suas polícias, mas elas existem
para prisioneiros de guerra, o que não se aplica hoje ao Brasil", disse o
consultor do Senado.
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