segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Estudo aponta 1.136 violações aos Direitos Humanos no Patrulha da Cidade

O programa Patrulha da Cidade, veiculado de segunda à sexta-feira na TV Ponta Negra, afiliada do SBT, cometeu 1.136 violações aos direitos humanos nos meses de abril e outubro de 2017. O monitoramento inédito no Rio Grande do Norte foi realizado pelo Observatório Latino Americano de Comunicação, Mídia e Direitos Humanos (Amaru) e divulgado terça-feira (28) em evento promovido pelo Departamento de Comunicação Social da UFRN. O grupo analisou 25 edições do programa líder de audiência horário do almoço. Os meses de abril e outubro foram escolhidos em razão da disponibilidade da equipe.
Procurada pela agência Saiba Mais, a direção da TV Ponta Negra afirmou que enviaria um posicionamento oficial da empresa diante dos questionamentos encaminhados no final da manhã desta quinta-feira (30), mas até a publicação desta reportagem, não houve retorno.
Composto por professores e estudantes, essa iniciativa soma-se a outros observatórios de mídia existentes no país, e no Rio Grande do Norte tem uma tarefa árdua pela frente: monitorar supostas violações aos direitos humanos cometidas por programas policiais.
O Amaru constatou 399 violações em abril e outras 737 em outubro no Patrulha da Cidade. A análise foi feita por estudantes de comunicação e tinha por foco os programas exibidos nas segundas, quartas e sextas-feiras. Eles preenchiam uma tabela onde indicavam a violação cometida, quem teve os direitos violados, de onde partiu a violação, além da descrição do trecho identificado como violador de direitos. Esses dados serão submetidos na plataforma nacional Mídia sem Violações de Direitos, realizada pelo Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, que monitora violações aos direitos humanos ocorridas em programas policiais de todo país.
Entre os principais critérios para figurar na análise estavam indicadores como: desrespeito à presunção de inocência, incitação ao crime e à violência, incitação à desobediência das leis ou decisões judiciárias, exposição indevida de pessoas, exposição indevida de familias, discurso de ódio e preconceituoso, Identificação de adolescentes em conflito com a lei e violação do direito ao silêncio.
Segundo Aline Lucena, professora do Departamento de Comunicação da UFRN e uma das coordenadoras do Amaru, a escolha de investigar os programas policiais se deu pela falta de dados sobre os programas no Rio Grande do Norte e pelo fato do estado não figurar em outras pesquisas nacionais já realizadas sobre as violações de direitos humanos nesse tipo de atração.
– Nunca foi feito um monitoramento dessa forma em relação aos programas policiais de Natal, o Amaru foi pensado para atuar em parceria com a plataforma nacional mídia sem violações de direitos […] tínhamos a hipótese de que o Patrulha Policial era um violador de direitos e, com essa pesquisa, confirmamos cientificamente que esses direitos são violados.
O Amaru constatou, a partir dos monitoramentos, que 21% das violações aos Direitos Humanos foram cometidas pelo apresentador Cyro Robson, o Papinha. Pelo levantamento de outubro, Papinha proferiu ao menos 36 vezes discurso considerado de ódio ou preconceituoso, por 15 vezes incitou à desobediência das leis ou das decisões judiciárias e por 11 vezes fez algum tipo de incitação ao crime e à violência.
A professora Aline Lucena destaca a importância do apresentador na propagação do discurso divulgado pelo veículo:
– O apresentador é uma figura extremamente importante no programa, é na voz dele que estão as violações relacionadas ao discurso de ódio e preconceito, as violações relacionadas à incitação da violência e à desobediência da lei. Embora a pesquisa aponte que o repórter é quantitativamente o principal violador, mas no que se refere a proliferação de um discurso de ódio, ele esta de forma contundente na voz do apresentador
O monitoramento ainda mostrou que o alvo das violações são, na maioria das vezes, os acusados de crimes exibidos no programa. Em 37% dos relatos são eles que têm algum direito violado, seja pelo repórter que faz a matéria, seja pelo apresentador do programa. Em 12% dos casos observados como violadores de direitos, o alvo das violações eram as famílias das vítimas e em outros 13% as famílias dos acusados.

Monitoramento foi entregue ao Ministério Público


Com os primeiros dados coletados, uma representação foi protocolada junto à Procuradoria da Cidadania, no Ministério Público Estadual. No último dia 23 de novembro, o Amaru, junto de outras entidades, participou de uma reunião com o Procurador de Geral de Justiça, Eudo Leite, para tratar das violações aos direitos humanos na mídia. Com os novos dados, coletados em outubro, a ideia é preparar um relatório final que será encaminhado ao Conselho Nacional de Direitos Humanos, ao Ministério Público Estadual, ao Ministério Público Federal e também para órgãos internacionais como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.
O Amaru está vinculado à disciplina de Comunicação, Mídia e Direitos Humanos do curso de Audiovisual da UFRN. Os estudantes tem um papel crucial para a realização do monitoramento, aplicando as discussões teóricas sobre direitos humanos que acontecem na disciplina.
A estudante do curso de jornalismo da UFRN Amanda Monique Porfírio conta que o monitoramento mudou a visão que ela tinha do conceito de Direitos Humanos.
– Esse monitoramento mudou bastante a visão que tinha em relação aos conceitos de direitos humanos e a importância que nós temos, como futuros profissionais da comunicação, de fiscalizar e cobrar uma postura de ética e respeito em todos os veículos. Acho que esse foi o maior legado que esse monitoramento deixou pra mim.
O Observatório não pretende parar apenas na análise do conteúdo dos programas policiais e também vai monitorar, a partir do ano que vem, a audiência desse tipo de programa. Já está prevista a realização de pesquisas de recepção para entender como as pessoas consomem esse conteúdo. A relação com os anunciantes dos programas policiais também deverá ser foco.
Durante o lançamento do Amaru, panfletos denunciavam as marcas que anunciavam nos intervalos comerciais do Patrulha da Cidade, indicando que esse tipo de publicidade financiava a violação de Direitos Humanos. Entre os anunciantes que chamavam atenção estava uma escola de ensino fundamental da cidade, loja de brinquedos e várias empresas de segurança.
Aluna do curso de Publicidade e Propaganda, Andressa Milanez destacou a importância de ampliar horizontes, especialmente em relação ao monitoramento.

– O Amaru nasceu com o intuito de agregar positivamente na luta por Direitos Humanos em meio a uma mídia que se demonstra tão violadora. O monitoramento dos programas policialescos entrou como uma das ações do Observatório, mas objetivo é monitorar muitos outros conteúdos, ampliando os horizontes.

Fonte: Agencia Saiba Mais

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