quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

Marin vai do luxo em Nova York para prisão de 'terceiro mundo'

Num domingo antes do julgamento que o mandou para a prisão, José Maria Marin, o ex-presidente da CBF condenado por receber propina e lavar dinheiro no escândalo de corrupção da Fifa, foi almoçar com a mulher, Neusa, no restaurante de uma loja da Armani na Quinta Avenida.
Eles se sentaram numa mesa de canto, com vista para a porta da Trump Tower, o famoso prédio de luxo no ponto mais caro de Nova York, onde Marin vinha cumprindo prisão domiciliar havia dois anos. O cartola parecia animado, falando com a mulher e olhando para a rua.
Os garçons, presenteados em outras ocasiões com camisas da seleção brasileira e já acostumados a atender o casal nos dias de pouco movimento, cochichavam. "Ele deve estar pensando no Brasil", dizia um deles. "Há quanto tempo ele está mesmo enfiado naquele prédio?"

Neusa pagou a conta, como sempre fazia. Na saída, ela ainda passou os olhos pelas bolsas da coleção de inverno da grife italiana, um dos vários endereços de luxo que aparecem nos extratos bancários do cartola revelados no julgamento -eles mostram que Marin podia torrar mais de R$ 300 mil por mês em compras extravagantes.
Mas, naquele dia de chuva forte, o casal tinha pressa e não levou nada para casa. Minutos depois, eles atravessaram a rua para voltar à torre de vidro construída por Donald Trump antes que o magnata fosse eleito presidente.
O tempo mudou agora. Os seguranças na porta do prédio onde Marin comprou um apartamento de R$ 10 milhões já sentem falta do "cara da Fifa" que viam sair de vez em quando para passeios no Central Park, almoços rápidos na Armani e idas à missa na igreja de Saint Patrick.
O cartola tinha permissão para passear à tarde -só para fazer exercício, rezar e fazer compras- quatro vezes por semana e com autorização prévia da polícia, mas já não saía mais nas semanas pouco antes do julgamento.
Toda a ostentação e riqueza também ficaram para trás. Marin agora vive num presídio no Brooklyn, um bunker de concreto e tijolos à vista que ocupa três quarteirões ao lado de um enorme viaduto.
 
Prédio no Brooklyn que abriga prisão federal onde o ex-presidente da CBF José Maria Marin está detido Foto de: Federal Bureau of Prisons/Divulgação
Seus advogados tentaram -sem sucesso- convencer a juíza do caso, Pamela Chen, a deixar que ele aguardasse a sentença em casa. O tempo que ele passou em prisão domiciliar na Trump Tower não será descontado da pena de até 120 anos que pode pegar.
Minutos depois que o júri deu seu veredicto, condenando o cartola por seis das sete acusações que pesavam contra ele, guardas à paisana revelaram seus distintivos e levaram Marin à prisão conhecida como o "depósito de seres humanos" de Nova York.
O cartola passou o Natal num presídio em que detentos considerados perigosos ou violentos, como condenados por terrorismo, assassinato e estupro, dividem espaço com os que cometeram crimes mais leves ou de colarinho branco -no total, 1.800 homens e cerca de 50 mulheres cumprem pena no lugar.
Entre os presos famosos na mesma cadeia, estão o cartola paraguaio Juan Ángel Napout, outro condenado por envolvimento no escândalo da Fifa, e Martin Shkreli, o executivo da indústria farmacêutica acusado de fraude financeira depois de subir preços de um remédio importante no tratamento contra o HIV.
Também cumpre pena ali o primeiro homem condenado à morte em Nova York nos últimos 50 anos -Ronell Wilson foi preso por matar dois policiais. Na cadeia, ainda engravidou uma policial, outro caso que pôs a penitenciária nas capas dos tabloides.
Depois de seu julgamento, que ocorrerá no mesmo tribunal que condenou os dirigentes do futebol, o traficante mexicano Joaquín Guzman, conhecido como El Chapo, deve entrar para a lista dos detentos de lá.
Em maio deste ano, três policiais que trabalhavam nesse presídio foram detidos por causa de suspeitas de abuso sexual praticado contra pelo menos seis detentas. Outros casos de assédio também vêm sendo registrados em números bem acima da média nessa prisão.
Além da péssima reputação, que levou o presídio a ser comparado a "um país de terceiro mundo" por uma juíza, a cadeia do Brooklyn é conhecida pelas condições duríssimas impostas aos detentos.
 
O ex-presidente da CBF José Maria Marin Foto de: Stephen Yang/Reuters
O maior complexo federal de segurança máxima dos Estados Unidos, onde presos ficam em caráter provisório até sair a sentença, não tem área externa, mesmo que o banho de sol no inverno nova-iorquino seja um tanto glacial, nem acesso a aulas ou outros programas de reabilitação.
Detentos só veem a luz do sol quando permitidos a subir no terraço em cima do pavilhão e seguem uma dieta "pesada em carboidratos", de acordo com um advogado.
Mesmo que seja só uma parada no inferno carcerário, já que os presos são transferidos depois que recebem as suas sentenças, o cadeião do Brooklyn deixa suas marcas.
Marin deve ficar por ali pelo menos até fevereiro, quando seus advogados estimam que sua pena será definida. Não há no entanto, uma data marcada para isso e só depois da decisão da juíza, que estima ao menos dez anos de prisão para o cartola, ele pode ser transferido para outro presídio federal americano.
No lugar da vista deslumbrante que tinha para o Central Park, Marin terá de se acostumar com a visão das portas maciças de ferro, corredores e as celas do seu mais novo lar.

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