A ONU reconhece o acesso à internet como um direito humano, mas as
estatísticas mostram que, no Brasil, esse é um privilégio concentrado
nos mais ricos. Um estudo divulgado em junho pelo Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea) aponta que mais de 90% das pessoas de classes A
e B estão na rede, enquanto nas faixas D e E esse percentual é de
apenas 42%. Mas, mesmo entre os mais pobres conectados, a renda tem
impacto direto na forma de uso e no tipo de conteúdo consumido. Muita
gente só tem acesso à rede pelo celular e não desenvolve completamente
as habilidades das novas tecnologias digitais, sem nem saber operar um
computador.
O trabalho do Ipea foi baseado em dados das pesquisas TIC Domicílio
2017 e TIC Cultura, ambas realizadas pelo Centro Regional de Estudos
para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br). Winston
Oyadomari, coordenador das pesquisas no Cetic.br, explica que a inclusão
digital no país só avança com a popularização dos smartphones, o que
não é acompanhado pela qualidade no acesso, com o desenvolvimento de
habilidades.
— Para se pensar na redução de desigualdades, no acesso a bons
empregos, temos de olhar para quais são os usos pela lógica dos
dispositivos — diz Oyadomari. — Hoje, 49% dos usuários acessam a
internet apenas pelo celular. E existem habilidades, principalmente em
atividades profissionais, que só podem ser desenvolvidas no computador.
Foi essa a descoberta do estudante Lucas Bitar, de 20 anos, ao
participar de um curso de empoderamento digital oferecido pela ONG
Recode, na Redes da Maré, no Complexo da Maré. Até então, sua
experiência com internet se restringia a fuxicar a vida de celebridades e
conversar em redes sociais pelo celular.
— No primeiro dia do curso, a professora pediu para a gente ligar o
computador, e eu não sabia como — lembra. — O curso expandiu meus
horizontes. Aprendi a fazer pesquisas e usar ferramentas de
produtividade, e logo depois consegui um emprego. Moro no Complexo da
Maré, onde a educação é muito precária. No Brasil, a desigualdade se
encontra até no acesso à internet.
Abismo digital persiste
Segundo os dados das pesquisas do Cetic.br, entre as pessoas que
nunca usaram a internet ou não fizeram uso nos três meses anteriores à
entrevista, 50,9% tinham renda de até um salário mínimo. Sobre o uso,
entre os que não fizeram nenhuma das práticas registradas pela pesquisa
(jogos on-line, música on-line, vídeos, baixar filmes, músicas e jogos),
39,2% pertenciam a essa mesma faixa de renda.
— O uso da internet reflete as desigualdades sociais — afirma o
pesquisador Frederico Augusto Barbosa da Silva, um dos autores do estudo
do Ipea. — Em linhas gerais, quanto maior a renda, maior a
probabilidade de se encontrar um usuário mais intenso da rede.
Rodrigo Baggio, presidente da ONG Recode, defende que é preciso
pensar em políticas públicas hoje para que os jovens mais pobres tenham
acesso ao mercado de trabalho do futuro. O abismo digital que persiste
tende a reforçar a desigualdade social em um mundo que caminha para a
quarta revolução industrial.
— Um estudo da UnB aponta que mais da metade dos empregos formais do
país podem ser substituídos por softwares e robôs. São 30 milhões de
vagas que deixarão de existir — alerta Baggio.
O Google tem uma equipe dedicada a pensar em como usar a tecnologia
para melhorar o acesso e a experiência de uso da internet pela população
mais pobre. David Shapiro, diretor de Negócios e Operações da
iniciativa Next Billion Users, explica que o foco está em países em
desenvolvimento, incluindo Brasil e Índia.
O Brasil inspirou um dos projetos. Há alguns anos, pesquisadores
perceberam que o brasileiro sofria com o espaço de armazenamento dos
smartphones. Quando ia tirar uma foto, precisava apagar outra para
liberar memória.
— Por que o telefone não pode liberar espaço automaticamente? Então
criamos o Files, um gerenciador que indica quais arquivos estão seguros
na nuvem e podem ser deletados — diz Josh Woodward, diretor do Google
Station.
Agora, os pesquisadores do Next Billion Users se voltam para quem nunca teve celular.
— Em Puebla, no México, mostrei a algumas pessoas vários ícones
comuns. O símbolo de Wi-Fi, o ícone de menu, e elas não tinham a menor
ideia do que eram — diz Woodward. — Quando pensamos em design,
precisamos pensar nessas pessoas que nunca acessaram a internet.
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O GLOBO
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