quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Como dois jovens com a primeira mala postal aérea inauguraram o Correio Aéreo Nacional (CAN)

 Em Coluna, Ricardo Lobato explica a curiosa história da inauguração da primeira linha brasileira de transporte aéreo militar

 Avião da década de 50 utilizado  pelo Correio Aéreo

Já era noite quando, em 12 de junho de 1931, dois jovens desceram de um táxi e entregaram uma mala postal na estação central dos Correios de São Paulo. Seria apenas mais um fato corriqueiro, não fosse esse acontecimento a inauguração da primeira linha brasileira de transporte aéreo militar.

O táxi fora a última etapa de uma longa jornada que começara a centenas de quilômetros dali, no Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Essa viagem marcou o início do Correio Aéreo Nacional (CAN).

Nas décadas de 1920 e 1930, o uso comercial da aviação ainda se encontrava em seus primórdios. Mais que um novo instrumento de combate — como no caso da Primeira Guerra — o aeroplano passava, pouco a pouco, a interligar distâncias antes imensuráveis.

Não era apenas o início de uma nova fase de explorações, era também o início das companhias de transporte, de correspondência e de passageiros.

Aproximando as distâncias e encurtando o tempo de viagem, a aviação se firmava como um serviço cada vez mais necessário. O Brasil contava com um correio aéreo desde 1927, porém, era parte de uma rede maior da companhia francesa Aéropostale, que operava na América do Sul desde o ano anterior, tendo como parte de sua rota as cidades de Natal e do Rio de Janeiro.

A Aéropostale fora, inclusive, precursora nesse tipo de serviço. Entre seus pilotos, havia diversos ases da aviação, como o piloto escritor Antoine de Saint-Exupéry, diretor de sua filial sul-americana. No entanto, por problemas financeiros ocasionados pela crise de 1929, a companhia encerrou suas atividades na América do Sul no início da década de 1930.

Com um corpo aéreo militar desde 1919, as Forças Armadas não estavam alheias aos progressos aeronáuticos. E para dar um retorno à sociedade, em 1931 o então ministro da Guerra, general Leite de Castro, atendeu ao apelo de um grupo de jovens aviadores militares que ansiava partir da teoria para a prática.

O ministro autorizou a criação do Correio Aéreo Militar (CAM), que tinha o objetivo de “auxiliar na integração nacional”. O comando da nova Unidade Aérea foi entregue ao major Eduardo Gomes, que confiou a dois de seus pilotos, os tenentes Casemiro Montenegro e Nelson Lavenére-Wanderley, sua primeira missão: iniciar um serviço aéreo entre as cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo.

A bordo de uma aeronave Curtiss “Fledging” de matrícula K263, apelidada de “Frankenstein”, partiram com uma mala postal — apenas duas cartas — rumo a São Paulo. A autonomia de voo era de cinco horas e meia. Optaram por uma rota que passava por cima das altas montanhas do litoral.

Apesar do céu claro, encontraram uma forte corrente de ar, obrigando-
os a diminuir a velocidade. A viagem durou cinco horas e vinte minutos, fazendo com que chegassem com o tanque quase vazio e com as luzes da cidade já acesas. Para completar, tiveram dificuldades de localizar o Campo de Marte, onde deveriam pousar, tendo de aterrissar, então, na antiga sede do Jockey Club, na Mooca.

Com o local deserto (mas uma missão a cumprir), pularam o muro e tomaram um táxi, que os levou finalmente ao destino, entregando o malote nos Correios da Avenida São João. Três dias depois, retornariam ao Rio de Janeiro com mais correspondência, desta vez optaram pela “rota do Vale do Paraíba”, mais curta e rápida. A missão fora cumprida e o primeiro passo fora dado.

Baseado nesse sucesso, nos meses seguintes o Correio Aéreo se espalhou pelo país, consolidando-se como um instrumento da tão almejada integração nacional brasileira.


 

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