sábado, 17 de dezembro de 2016

Após 15 mil entrevistas, Jô Soares se despede de talk show nesta sexta-feira

Diário de Pernambuco
Último convidado do programa será o ilustrador Ziraldo, campeão no número de entrevistas
Após o fim do talk show, o apresentador ainda não anunciou o que fará. Foto: TV Globo/Divulgação
"Estou muito preocupado em ver que não terei mais você nas minhas madrugadas". A frase de Roberto Carlos para Jô Soares poderia ser dita ao apresentador por muitos brasileiros. Telespectadores desenvolveram, ao longo dos últimos 28 anos, o hábito de só ir para a cama depois do famoso "beijo do gordo". A despedida oficial do Programa do Jô, nesta sexta-feira, na Globo, marca o fim de uma era na televisão brasileira. Há quase três décadas como apresentador de talk shows, tendo se dividido entre o SBT (Jô Soares Onze e Meia) e a Globo, Jô imprimiu uma característica própria e popularizou o gênero no Brasil.

O apresentador reinava absoluto até 2014, sem concorrentes de talk shows - no horário - na TV aberta, até que começaram a surgir humoristas como Danilo Gentili (The noite, SBT), Rafinha Bastos (ex-Agora é tarde, na Band), Fábio Porchat (Programa do Porchat, na Record) e Marcelo Adnet (Adnight, na Globo) à frente de programas variados, com espaço para quadros, humor e entrevistas. Apesar disso, Jô Soares preservou a essência do formato 'bate-papo'. "Num momento em que a maioria dos talk shows, nos EUA e no Brasil, segue a fórmula de ‘mais show, menos talk’, Jô se mantém fiel à ideia de que a essência dos programas deste tipo é a boa conversa", ressalta o pesquisador e crítico de televisão Maurício Stycer, autor de Adeus, controle remoto.


Do Jô Soares Onze e Meia, exibido entre 1988 e 1999, ao Programa do Jô, de 2000 até 2016, foram cerca de 15 mil entrevistados ao longo de 5,6 mil edições - 3518 na Globo. Entre eles, os ex-presidentes Lula, Fernando Henrique Cardoso, Dilma Rousseff e Fernando Collor de Melo. O último convidado será o ilustrador Ziraldo, o campeão de entrevistas da atração, com 23 no total. Ao longo da semana, o apresentador recebeu as duplas sertanejas Chitãozinho & Xororó e Bruno & Marrone e as atrizes Tatá Werneck e Claudia Abreu. A Globo ainda não anunciou detalhes da edição derradeira, mas não há intenção de dar dramaticidade à despedida - como ocorreu com a aposentadoria em 2015 de David Letterman, icônico apresentador dos Estados Unidos, regada a especiais.

O apresentador afirma que a decisão de terminar o programa foi tomada há dois anos em comunhão com a emissora. "Queria sair de forma digna e não de maneira melancólica. Prefiro deixar saudade do que incômodo. As pessoas falam com carinho até hoje do Viva o Gordo (1981-1987), do Planeta dos homens (1976-1982), do Faça humor, não faça guerra (1970-1973). Quero isso para o Programa do Jô", disse, em entrevista recente ao jornal O Globo.

A última temporada do Programa do Jô assumiu um risco. Em meio à pulverização de uma sociedade dividida entre a favor e contra o impeachment de Dilma Rousseff, Jô Soares contemplou a discussão no quadro político Meninas do Jô, exibido às quartas-feiras - nesta semana vai ao ar na quinta-feira. "O programa tentou se beneficiar da discussão do processo de impeachment de Dilma de maneira mais fresca. Mas eu achei que, em alguns momentos, o tom estava tendencioso. Acho que o programa se arriscou em ser tão favorável ao 'fora Dilma' e perdeu um pouco a diversidade", analisa o pesquisador Igor Sacramento, do departamento de Comunicação e Cultura da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Como contraponto, ele exemplifica o início do Adnight, de Marcelo Adnet, que levantou o coro #foratemer.

Antes disso, o apresentador foi hostilizado. Em 2015, entrevistou a presidente Dilma e recebeu críticas. Teve até a casa pichada com ameaças. Neste ano, defendeu o ator José de Abreu contra a intolerância política e chegou a usar vermelho no programa. Depois, mudou o tom ao convidar e elogiar Sérgio Moro, responsável por conduzir a Operação Lava-Jato - mas o juiz recusou.

A postura política, no entanto, não tem a ver com o desfecho do programa. Em tempos de internet e serviços de streaming, a busca por renovação é quase uma sentença na televisão. A saída de Jô Soares percorre caminho semelhante ao da televisão norte-americana, na qual Jay Leno e David Letterman se despediram dos respectivos talk shows nos últimos dois anos. "Com o perdão do clichê, deixa um vazio. Como todo bom apresentador de talk show, Jô tinha um estilo único e inimitável", ratifica Stycer.

Pedro Bial, atual apresentador do Programa com Bial no GNT, assume a tarefa difícil de substituto. A mudança promovou uma "dança das cadeiras": Tiago Liefert ocupará o lugar de Bial à frente de Big brother Brasil, André Marques vai para o The voice kids. O fim do Programa do Jô está longe de ser o término da carreira do apresentador. "Acho que ele não vai ficar muito tempo fora da televisão. Deve ser contratado por outra emissora, já que tem um público fiel", conclui Sacramento. 

Despedida de gigantes
Em 2014, Jay Leno se aposentou do comando de talk show e, após 22 anos, foi substituído por Jimmy Fallon, atual apresentador do Tonight show, responsável por imprimir um humor mais dinâmico e corporal ao programa. A edição de despedida reuniu celebridades como Oprah Winfrey e Kim Kardashian, além de depoimentos gravados do presidente dos EUA, Barack Obama, do ator Matt Damon e da cantora Miley Cyrus. Em 2015, foi a vez de David Letterman dar adeus após 33 anos. E foi com a banda Foo Fighters, que tocou Everlong, música favorita do apresentador. Em vídeos, os ex-presidentes George H. e George W. Bush, Bill Clinton e o atual Obama, além de celebridades, participaram.

Pernambucanos no sofá
Os cantores e compositores Alceu Valença e Geraldo Azevedo, o ator Jesuíta Barbosa e o humorista Murilo Gun foram alguns entrevistados da última temporada do Programa do Jô. Alceu e Geraldo foram acompanhados de Elba Ramalho para falar de O Grande Encontro. Jesuíta conversou sobre os trabalhos recentes na televisão, como a série Justiça, e a trajetória teatral. Ao lado do ator e humorista Bento Ribeiro, Murilo falou sobre o programa A pergunta que não quer calar, do Multishow, na quarta entrevista do comediante. "A primeira vez foi em 1997, quando tinha 13 anos. A televisão tinha uma força diferente. Eu saí chateado, porque Jô tirou muita onda de mim. Coisa de criança. Aquela entrevista abriu muitas portas para mim", relembra.

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